Humanal estreia em grande estilo com 'Delirium' e consolida força no metal brasileiro
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Humanal - Foto: divulgação |
A banda curitibana de groove/progressive metal lança seu primeiro álbum completo, com faixas intensas como “Xawara” e “Burnout”, e se firma como um dos novos destaques da cena nacional
Por: Ingrid Natalie (instagram: @femalerocksquad)
A Humanal, banda curitibana de groove/progressive metal, chega a uma nova fase com o lançamento de “Delirium”, seu primeiro álbum completo (lançado na quarta, 13 de agosto). Finalistas do concurso New Blood do Bangers Open Air e com a experiência de abrir para o Slaughter to Prevail, o quarteto consolida uma identidade sonora visceral e reflexiva — marcada pela entrada de Tati Klingel nos vocais e por arranjos que ampliaram a liberdade das guitarras de André Lazzaretti, os grooves peculiares de André Preto e a sólida base teórica de Maurício Escher.
Entre os destaques do disco estão “Xawara”, inspirada no livro “A Queda do Céu” de Davi Kopenawa, e “Burnout”, que transforma em música as pressões e o esgotamento da vida moderna. Gravado em esquema DIY e pensado para traduzir cada temática em textura sonora, “Delirium” atravessa assuntos como vício, depressão, opressor/oprimido e a fricção entre real e virtual — sempre com o peso do metal como veículo de catarse. A seguir, a Humanal fala sobre a formação, o processo criativo e o impacto desse debut na trajetória da banda.
FRS: A Humanal nasceu em 2020 e passou por mudanças importantes na formação. Como cada integrante contribuiu para moldar o som que vocês têm hoje?
Tati Klingel: Quando entrei na banda, o objetivo inicial era começar a fazer shows, e tinham algumas músicas que ainda não haviam sido gravadas. Ficamos, aproximadamente, três meses ensaiando para fazer a estreia ao vivo da banda. Consideramos que a grande mudança foi em relação ao vocal e nas linhas melódicas nas músicas. O André Lazzaretti tem um vocal impressionante e sempre faço questão que ele cante, pois é um vocal que considero muito raro. Mas, ao assumir os vocais, acredito que a liberdade de arranjos de guitarra cresceu muito. Então, da minha perspectiva, o André Lazzaretti contribuiu com riffs de guitarras surreais, eu nunca imaginaria algo igual ao que ele fez. O André Preto tem uma identidade muito peculiar na bateria e contribuiu para ritmos bem "groovados". O Maurício Escher tem um conhecimento de teoria musical muito avançado, que contribuiu para criar as estruturas das músicas. E eu, que componho de uma forma mais intuitiva e sentimental, pude trazer um tempero mais visceral para as canções.
FRS: O que motivou a transição do som inicial, com mais psicodelia, para um thrash/groove metal mais agressivo?
Tati Klingel: Acredito que o processo criativo de uma banda é gradual. Ao ouvir a Humanal pela primeira vez, o que me chamou a atenção foi o vocal muito visceral e é o que me fez virar fã da banda antes de fazer parte. Então, a questão visceral eu quis manter, que traz a agressividade para a banda. E nós estamos falando de assuntos muito pesados, e desde o início pensamos “como podemos explorar o som dentro dessas temáticas?”. "Burnout" tem muito isso, inicialmente ela era mais reta, e o momento do refrão é um momento de caos, e a bateria do André Preto que traz esse caos. Em "Echoes of Ether", a guitarra é quadrada, é pixelada. Em "Spiritless" o baixo fretless traz uma inércia no som. Enfim, a psicodelia ainda ocorre, mas de uma forma mais visceral.
FRS: A entrada da Tati Klingel marcou uma nova fase para a banda. Como foi o processo de adaptação e química criativa com ela?
Tati Klingel: Em minha visão, a Humanal precisava se reinventar para abrir espaço a novas possibilidades. Quando o vocalista é também um instrumentista, há uma questão relevante na composição e execução. Acho que a minha entrada marcou a liberdade de composição das guitarras, algo sem limites. Além disso, pelo fato de eu ser uma pessoa mais sensível, houve esse cuidado de colocar algo mais sentimental e etéreo nas músicas. Foi tudo muito natural e um processo enriquecedor para todos da banda em relação à produção de arte.
FRS: “Delirium” é o primeiro álbum completo da banda. Como foi o processo de produção e quais foram os maiores desafios para chegar ao resultado final?
Tati Klingel: Acho que o principal ponto era conseguir expressar com sonoridade a temática de cada música. O processo de produção foi estudando e experimentando metodologias de composição, captação e edição. A banda teve participação em todos os processos, considero como um “Do it yourself”. Tudo foi gravado no quarto da minha casa, e a mixagem e masterização foi feita por Alisson Fioren, um mestre da produção sonora de metal em Curitiba. Por não termos limites de tempo, algumas músicas tiveram improvisos muito interessantes. Posso destacar "Spiritless", que na parte final da música foi uma improvisação do baixo, por Maurício Escher, e também em "Art of Losing", que vocalizei as notas dos harmônicos, e o André Lazzaretti tirou de ouvido e criamos o clima final da música. Acredito que cada arte criada tem seu processo específico e nós da Humanal não criamos limitações para a nossa criatividade.
Capa do álbum 'Delirium' |
FRS: A faixa “Xawara” é inspirada no livro "A Queda do Céu", de Davi Kopenawa. Como surgiu a ideia de transformar essa obra tão marcante em música?
Tati Klingel: A ideia surgiu do Maurício Escher, mas o André Preto que se identificou e abraçou a música na criação da letra. Eu fiz ajustes em palavras para trazer uma poética e uma sonoridade mais interessante para a música. "Xawara" foi uma música muito difícil, pois não é nosso lugar de fala. O André Preto soube valorizar muito o tema, criando uma história distópica ao longo da canção.
FRS: Em “Burnout”, vocês abordam o esgotamento mental e a pressão da vida moderna. Essa é uma experiência pessoal de algum integrante ou uma observação mais ampla sobre a sociedade atual?
Tati Klingel: É uma experiência pessoal vivida por mim. Sou neurodivergente, com TDAH, e os episódios de "burnout" ao longo da minha vida se tornaram comuns. Explorar esse tema para mim foi libertador, pois o esgotamento mental é muito negligenciado. Todos da banda tiveram muito respeito por essa canção e acredito que ela é uma verdade. É a primeira vez que abro esse assunto em música e me exponho desta maneira. Acredito que nessa entrevista é a primeira vez que falo sobre meu TDAH, diagnosticado aos 37 anos. A Humanal me proporcionou essa liberdade, junto com a compaixão de entender meu jeito neurodivergente de ser. Somos diferentes, pensamos diferentes, agimos diferentes, fazemos arte de forma diferente. Enfim, ter um lugar seguro para poder se doar artisticamente foi para mim algo muito importante.
FRS: O título “Delirium” tem um peso simbólico. O que ele representa para vocês e como se conecta às temáticas das músicas?
Tati Klingel: O que define esse nome é a ideia de um delírio coletivo, do vício à depressão que leva ao esgotamento e à distopia da invasão dos brancos em terras brasileiras. Tudo parece tão surreal, mas ao mesmo tempo é real e está acontecendo o tempo todo. "Echoes of Ether" se relaciona com o diálogo que temos entre o real e o virtual, "Abyss" com a obscuridade da depressão, "Addiction" com o vício em qualquer parâmetro da nossa vida, "Burnout" com o esgotamento mental, "Oppressor" com o ciclo de opressor e oprimido, tão comum no nosso cotidiano; "Xawara" com a distopia da invasão e exploração de povos originários, "Animal Social" com a máscara que criamos para conseguir sobreviver, "Spiritless" com a reflexão sobre nosso caráter e espiritualidade e fechando com "Art of Losing" que explora a resiliência que temos quando não conseguimos aquilo que almejamos. Ou seja, o álbum caminha por um ambiente de reflexão que remete ao delírio coletivo.
Assista ao vídeo de "Echoes Of Ether":
FRS: Vocês ficaram entre os finalistas do concurso New Blood do Bangers Open Air. Como foi participar dessa seleção e o que essa experiência trouxe para a banda?
Tati Klingel: Ninguém da banda esperava por isso e foi algo muito positivo para conseguirmos divulgar nosso som em terras paulistas, que é considerado um polo musical e metalístico muito importante no nosso país. Nosso novo integrante da banda, Rafael Barcellos que nos inscreveu, sem muita pretensão, e assumiu toda a comunicação com a Kiss FM. No concurso tivemos contato com bandas e pessoas incríveis que tiveram muito cuidado ao passar um feedback para nós e que contribuíram para a nossa construção artística. A experiência foi ainda mais especial graças à incrível hospitalidade da Kiss FM e ao apoio incansável de Angie Ramms como roadie de palco. Somos imensamente gratos a eles.
FRS: Abrir para o Slaughter to Prevail foi um marco na carreira da Humanal. Como foi a recepção do público nesse show e o que mudou para vocês depois dessa apresentação?
Tati Klingel: Confesso que fiquei com muito receio antes de subir ao palco, e acho que todo(a) vocalista ficaria assim ao enfrentar um público do Alex Terrible. A energia do público era contagiante, tornando a nossa apresentação inesquecível. Teve a participação da Ross Mirabal fazendo a performance na "Echoes of Ether", a mesma que fez no clipe. Ela colocou no palco toda a expressão que a música tem, e o público ficou louco com esse momento. Ela é uma artista incrível e com uma performance de dança muito autêntica, muito autoral. Após o show conversei com muitas pessoas que assistiram e viraram fãs da banda. Ficamos muito gratos pela Xaninho Records pelo apoio para a nossa participação neste show, pois representar Curitiba na abertura de um show de uma banda russa era algo surreal para nós.
FRS: Para concluir, o que os fãs podem esperar da Humanal nos próximos lançamentos?
Tati Klingel: A Humanal tem um significado: buscar um som que represente algo humano, algo visceral que explore a reflexão sobre nossas vidas. Nossas composições não são voltadas para o comercial, são verdades que instigam e que provocam nossa mente. Então, nossos fãs podem esperar algo completamente surreal e inimaginável para os próximos lançamentos. Nossa música não é apenas um produto, é uma arte que procura a verdade em nosso cerne. E como artista, sinto que estamos cumprindo nosso papel, que é gerar reflexão e mudança.
Ouça "Delirium" na íntegra:
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